Visita das Lideranças do Clã Moy Jo Lei Ou 


Dia 2, Parte 1: Manhã de Realizações


Marcamos de acordar aquele dia às 07:00 para iniciarmos a prática matinal. Levantei as 06:30, me organizei e fui para sala, onde o Lennart estava dormindo. Si Fu saiu do quarto em horário britânico, pontualmente às 07:00 e Lennart tentava acordar como conseguia. Si Fu ainda brincou com ele que se ele demorasse a levantar na imersão, o Si Hing Carlos Antunes ia rapidamente ajudá-lo a acordar (risos). O tempo havia melhorado e até dava pra ver o Sol, embora a temperatura ainda estivesse por volta de 10 C. Fomos então em direção ao Manor Park, um parque muito agradável que iríamos passar o dia anterior.

Chegando lá, andamos até o final do parque, que é bem pequeno, e Si Fu definiu um local para praticarmos. Após uma rápida conversa, Si Fu nos pediu que fizesse Siu Nim Tao. 


Fizemos o Siu Nim Tao e tive a boa surpresa que lembrava de toda sequência. Si Fu em seguida me pediu que fizesse com apenas uma perna e em seguida elogiou a postura e a sequência. Não sei exatamente explicar como, mas de fato aquilo foi muito confortável e eu senti uma facilidade inesperada dado que não me lembrava a última vez que tinha feito Siu Nim Tao. 

Em seguida, Si Fu me pediu que fizesse o Chum Kiu, o qual também saiu melhor do que eu esperava. Tive três realizações nesse exato momento. Primeiro, ficou evidente que tenho uma certa tendência de me colocar muito para baixo numa espécie de impostor syndrome; segundo, e esse talvez tenha sido o grande momento “eureka” daquela manhã, eu percebi que estou na família Kung Fu há mais de 8 anos. Sim, meu Hoy Kim foi no dia 24 de Fevereiro de 2015, com o Baai Si em 22 de Novembro daquele mesmo ano. Então de fato, foi uma caminhada de bons anos e não fazia sentido algum eu duvidar do potencial que tinha para realizar a sequência sem maiores dificuldades. E terceiro, nunca deixei de fato de praticar Kung Fu. Talvez os dispositivos do sistema, talvez aquela prática mais física com meus irmãos Kung Fu, mas nunca deixei de praticar de fato. 

Escuto com muita frequência no meu trabalho e no meu círculo de amizades que as minhas maiores virtudes são a facilidade de conexão, minha habilidade de relação interpessoal e o respeito para com o outro. Curiosamente, há pouco mais de 1 mês, escutei da mãe de uma paciente pediátrica que diagnosticamos com um distúrbio genético raro e irreversível — que de fato iria levá-la a cegueira em alguns anos — que eu havia lido muito bem o cenário daquela consulta. Fiquei curioso e perguntei o porquê no final da consulta. Essa mãe riu e me disse que enquanto eu respondia questões complexas levantadas pelo pai da criança, eu brincava com a criança (que não entendia exatamente o que estava acontecendo) e ainda entreguei, sem olhar, uma caixa de lenço de papel para aquela mãe quando ela estava com lágrimas nos olhos (com toda razão, dada a gravidade da situação). Agradeci, e com um sorriso disse que não me lembrava de ter feito nada disso. Essa leitura foi quase inconsciente; estou certo que eu devo isso em algum nível ao Ving Tsun e ao que me foi passado pelo meu Si Fu e meus irmãos. É difícil explicar…

Chi Sau com Si Fu


Si Fu e Lennart praticando Chi Sau


Lennart demonstrou muito Kung Fu ao fazer a sequência inteira, mesmo tendo esquecido alguns segmentos. Si Fu reforçou uma idéia que já o vi frisando diversas vezes, a idéia de “só fazer” e não se preocupar com o que vai sair. Si Fu em seguida me pediu que fizesse Chi Sau com o Lennart, o que foi uma felicidade grande porque o Lennart não havia feito isso até então, e também um desafio gigantesco já que não fazia Chi Sau desde minha passagem para o Biu Ji em 2019. O tempo esfriou bastante e Si Fu sugeriu que voltássemos para o salão no alto do prédio.

Ao chegarmos, praticamos um dos Chi Sau mais surreais que já fiz na minha vida, no rooftop do prédio. Foi muito legal ter aquela experiência, já que a maioria das práticas que tive foram dentro do ambiente do Mo Gun ou em algum seminário. Si Fu me pediu para mobilizar o Lennart e fiquei muito feliz quando disse que meu estímulo estava “bem bom”. Um comentário rápido mas um momento especial pra mim.

Chi Sau com Lennart no Rooftop do Sienna House


Quando a prática ficou extremamente proveitosa e interessante, Si Fu pediu que parássemos ali. Dava pra escutar a alma do Lennart dizendo que queria mais (risos). Foi exatamente a primeira coisa que o Si Fu pontuou, aquela era hora de parar exatamente por esse motivo. Anna também havia acabado de me enviar uma mensagem dizendo que Si Mo tinha acordado. 

Antes de descermos, Si Fu conversou sobre o significado daquela prática e queria escutar de nós o que achamos. Minha cabeça deu uma volta no tempo e me lembrei imediatamente de meu Si Hing e Gaai Siu Yan, Pedro Ivo, que estava me Portugal. A maior parte do Ving Tsun Experience foi todo passado por ele e por Si Hing Thiago Silva. Me lembrei de como era bom e como tive bons momentos indo ao Mo Gun do Blue Sky, praticamente em frente a minha casa quando morava no Rio. Me lembrei ainda de um episódio do Podcast Vida Kung Fu em que escutei o Si Hing Thiago Pereira falando sobre genealogia e o visível/invisível, onde ele ressaltou que é importante respeitar o momento e a fibra de cada praticante e que as vezes de fato, se era pra interromper naquele momento, era pra interromper. Não lembro o contexto e não sei como foi que essa associação surgiu do nada, mas senti saudades. Muitas. E percebi o quanto aquilo me fazia falta quando estava longe. Não mais… 


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Thales Guimarães
Moy Tai Lei